09/09/2012


. Silêncio .

Desenfreei. 

Desandei a falar sobre tudo que era banal enquanto ele me olhava silenciosamente. Esgotei todos os assuntos e ele somente assentia com a cabeça, imóvel, que sim, que não, que talvez. 

Desandei.

A cada respiração mais grave ele somente piscava lentamente me prendendo naquele silêncio absurdo de quem precisa ouvir mais que o zumbir do mosquito pairando no ar.

Era noite. Chovia. A água batia no telhado provocando o único barulho que eu ouvia. E ele permanecia calado.

Minha vontade de contar todas aquelas coisas foi sendo minada pela falta de interação, pelo diálogo que virava monólogo a cada tentativa de tornar aquele silêncio menos constrangedor. Nada que eu falasse tirava ele do estado mumificante da falta de palavras.

Ele sorria com os olhos e eu me irritava com a boca.

O interesse em compartilhar a vida virou uma incontrolável vontade de exterminar qualquer vestígio dele em mim. A raiva me tomava a cada olhar imutável que ele dirigia a mim.

Xinguei. 

Xinguei muito a falta de colaboração naqueles fatos, xinguei a minha existência ao lado dele, xinguei as outras mil gerações que viriam, mesmo que todas elas partissem de mim. 

E enquanto jogava todas as roupas dele pela janela, enquanto quebrava todas as porcelanas que a mãe dele me dera naqueles anos todos, enquanto causava a revolução naquela casa, ele permaneceu quieto.

Quando acabei de desandar, quando achei meu freio, quando não havia mais palavra para expressar, ele tocou minha testa com os lábios, me abraçou forte e disse: 'Vai ficar tudo bem'. E então abaixou para pegar os cacos, desceu para recolher as roupas, arrumou todas as almofadas que haviam voado em sua direção, esquentou o café e sentou no sofá, calmo, tranquilo e mudo.

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